angustia

Já me angustiei por muito menos…

Vitor Viana, para uma roda de conversa sobre a angústia.

Primeiro passo é tomar conta do espaço… Antes ocupe depois se vire.

Torquato Neto

Boa noite a todos, primeiramente, quero dizer que já me angustiei por muito menos. Me desculpem pelo jargão, mas precisava soltá-lo antes de começar esse trabalho.

Agradeço ao Campo Psicanalítico, pelo lugar que faz semear minha formação. Assim, por esse comprometimento e respeito a minha formação e ao campo psicanalítico, é que aceitei estar aqui com vocês.

Esse pequeno trabalho é um produto do que consegui alcançar nos estudos dentro do cartel que faço parte, fazendo um percurso dos textos de Freud (O mal estar na cultura; o infamiliar; três ensaios sobre  a sexualidade,; inibição, sintoma e angústia) e dos capítulos I a IV do Seminário 10 de Lacan.

Pois bem, passado os preliminares e marcando minha posição atual dentro do campo psicanalítico e dos textos trabalhados no Cartel, vou apresentar o que me tocou sobre os estudos do tema. 

Penso que os trabalhos sobre a angústia começaram em função da existência de um mal estar que a medicina não consegue dar conta, não consegue nomear e/ou curar.

Freud, no texto três ensaios sobre a sexualidade, nos demonstra que a angústia era concebida como meramente somática, energia que não havia sido descarregada pela via sexual e por isso estava represada, levando ao adoecimento psíquico. Se ela atingisse níveis inaceitáveis, poderia vir a ser expulsa repentinamente sob a forma de um ataque – pura descarga neurovegetativa.

Outrossim, ficou demonstrado que, a vida, tal como nos é imposta, é muito difícil para nós, nos traz muitas dores, desilusões tarefas, etc. (Freud, 1930), concebendo a angústia como consequência do recalque.

Freud, em “O Mal-Estar Na Cultura”, evidencia que para suportá-la não podemos prescindir de medidas paliativas, que podem ser de três tipos:

  • Distração poderosa: que nos permitem menosprezar a nossa miséria, como por exemplo, a atividade científica;
  • Satisfações Substitutivas: que amenizam nossas dores, criando ilusões em relação à realidade, como por exemplo, a arte;
  • Substâncias entorpecentes: que nos tornam insensíveis a nossa miséria.

Freud (1930) apresenta em seu texto que o ser humano se torna neurótico porque ele não consegue tolerar a quantidade de impedimentos que a sociedade lhe impõe a serviço de seus ideais culturais, concluindo que para se ter a possibilidade de retorno a felicidade se faz necessário que essas exigências sejam abolidas.

Outrossim, vemos que as exigências da vida vão mudando e o sujeito vai lidando com essas exigências, o que pode gerar a crise de angústia, a ausência de representar o perigo. O sujeito cria recursos para fazer frente a esse perigo.

Conforme Freud relata, “o determinante fundamental da angústia automática é a ocorrência de uma situação traumática, e a essência disto é uma experiência de desamparo por parte do eu face de um acúmulo de excitação, quer de origem externa quer interna, com que não se pode lidar.”. (FREUD, 1926)

Nesta senda, entendi que a angústia como algo que não conseguimos nomear, advindo então do real lacaniano.

Em “inibição sintoma e angústia”, Freud diz que a angústia difere da inibição, haja vista que nesta vemos algo que diz respeito ao movimento enquanto posição frente ao gozo. Frente ao gozo o sujeito paralisa.

Também difere do sintoma, pois este seria um substituto de uma satisfação pulsional que não aconteceu. Sintoma, então, seria a consequência do processo de repressão.

Desta forma, a inibição é a diminuição ou bloqueio de funções psíquicas ou comportamentais, resultando em dificuldades no desempenho de atividades cotidianas. Essa inibição pode ocorrer em diversas áreas da vida, como no trabalho, nas relações sociais ou no prazer sexual, e é frequentemente associada a conflitos internos não resolvidos. 

A angústia (ou ansiedade, para trazer um pouco da contemporaneidade), por sua vez, é uma resposta emocional frente a esses conflitos, especialmente quando o sujeito sente que não pode lidar com eles. 

Freud distingue diferentes tipos de angústia, como a angústia neurótica, que surge de desejos reprimidos, e a angústia realista, ligada a ameaças externas. 

A inibição e a angústia podem estar interligadas, já que a impossibilidade de lidar com conflitos internos pode gerar um estado de tensão psíquica, manifestando-se como sintomas ou dificuldades funcionais. 

Um exemplo debatido nos estudos foi referente a uma pessoa que tem dificuldades em se relacionar socialmente pode experimentar uma inibição em suas interações, enquanto um sintoma relacionado a essa inibição poderia ser um comportamento obsessivo ou fóbico. A angústia, por sua vez, seria a sensação emocional que acompanha o conflito inconsciente que está na raiz do sintoma.

Agora, entrando no Seminário 10, também vou escrever o que eu consegui entender.

Já no início do Seminário, Lacan faz severas críticas às terapias do ego, deixando claro que o analista não entra na angústia do paciente, não diz “eu também” ou “eu sei que dor é essa”. Não há comunicação de empatia.

Lacan diz que a angústia é um afeto. Todavia, esse afeto está na ordem de uma perturbação e não de um sentimento. Ele vai mais além, diz que esse afeto é um afeto que não engana. O que engana é a demanda do paciente, por isso não devemos ter comunicação de empatia com ele.

Margareth Pisani certa vez apresentou um trabalho, que contempla o descrito acima. Ela citou o livro atos de fala de Jairo Gerbase, dizendo que a aposta a angústia é que se fale para alguém que pode te escutar.

Adentrando nos estudos, foi verificado que o Sujeito para se constituir ele se aliena para depois se separar. A alienação e a separação são fontes de angústia.

Mas quando a angústia se origina? Lacan responde com a frase: á quando a falta, vem a faltar.

Sendo assim, o sujeito se desorganiza e surge a angústia.

Lembro de um exemplo que José Antônio gosta de relatar, que é quando o estudante da graduação vai em busca de um diploma e que após conseguir entra em angústia, por não saber o que fazer, ou não ter algum emprego ainda.

Gostaria de trazer um outro exemplo de quando a falta, vem a faltar,  um trecho de uma música da banda The Smiths:

Heaven Knows I’m Miserable Now (Os Céus Sabem Que Agora Estou Infeliz)

“I was happy in the haze of a drunken hour (Eu estava feliz na névoa de um momento de bebedeira)

But heaven knows I’m miserable now (Mas os céus sabem que agora estou infeliz)

I was looking for a job and then I found a job (Eu estava procurando por um emprego e então eu encontrei um emprego)


And heaven knows I’m miserable now (E os céus sabem que agora estou infeliz)”

Por fim, deste trabalho, ou até onde foi possível meus estudos dentro do cartel, Lacan traz á baila o infamiliar de Freud. Vimos que essa desorganização poderia vim do recalque trazido por Freud no infamiliar.

Esse infamiliar, seria tudo o que deveria permanecer em segredo, mas que veio a tona. Lembrando que infmaliar, é de certa forma, um tipo de familiar.

Dos inúmeros seminários que participei durante esse início de formação aqui no campo psicanalítico (2022 online, frequentando nos seminários abertos ao público e 2023 e 2024 como participante), escutei que Lacan caminha em direção á dimensão do Um e sua relação com o sintoma. Sendo assim, é preciso construir um saber fazer com o que tropeça na experiência do sujeito, devendo o analista sustentar essa posição.

Termino com o que eu costumo escutar de Sonia Magalhães: “não sei se me fiz entender”

Mais uma vez, agradeço ao Campo Psicanalítico que se tornou o rio em que passa minha formação.

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